Vítor Silva: Professores e governo

Fui professor do Ensino Secundário durante quase trinta anos. Ao longo desse longo período de tempo sempre tive um enorme prazer naquilo que fazia, em particular no contacto com as gerações mais jovens.
A profissão de professor, de qualquer grau de ensino, é das mais dignas e importantes que existem, pois que é através dela que grande parte dos conhecimentos de uma sociedade se transmitem de geração em geração. É por isso que toda a sociedade, começando nos seus responsáveis políticos a deviam enaltecer permanentemente.
Antes do 25 de Abril de 1974 a profissão docente era altamente prestigiada em Portugal, não só porque a maioria da população tinha muito menos habilitações literárias que o conjunto dos professores, mas também porque o Estado Novo tinha a consciência da importância da educação na divulgação da sua ideologia, especialmente a nível da chamada Escola Primária.
O fim da ditadura levou à massificação do ensino e à entrada na profissão de milhares de professores. O carácter de elite da profissão acabou. Mas a consciência da enorme força reivindicativa que rapidamente adquiriram cedo levou à criação de conflitos com o governo. E quase sempre o governo de turno adoptou a estratégia de tentar colocar a sociedade contra os professores, apontando-os como uma classe que tinha privilégios que outros não tinham. Nessa estratégia sempre contou com a colaboração de uma matilha de escribas que caracterizaram os professores como trabalhando muito poucas horas, tendo três meses de férias no Verão e mais não sei quanto extra no Natal e na Páscoa. O que é um facto é que essa imagem colou-se junto de uma grande parte da população. Daí que qualquer reivindicação por parte da classe docente seja muito dificilmente apoiada pela população e também pelos opinadores que pululam nos órgãos de comunicação social.
Tenho a dizer que no caso que neste momento opõe os professores ao governo, sobre a contagem do tempo de serviço, considero que os professores têm toda a razão. O tempo que se passou a trabalhar não se pode apagar por decreto. E isto tanto é válido para os professores como para qualquer outra profissão. Outra questão é como se pode traduzir o tempo de serviço em melhorias salariais. Estão obviamente ligadas, mas são diferentes.
Não sei como vai acabar este conflito, mas o que verifico é que o governo tem do seu lado a opinião pública. Mas se é verdade que os professores perderam a opinião pública, provavelmente o governo perdeu os professores.