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Auto estrada já. Mas da água…

Auto estrada já. Mas da água…

Os portugueses têm que ser solidários em todas as vertentes da nossa sociedade. Se temos uma fábrica de cimento em Leiria obviamente que essa fábrica venderá cimento para todo o País. Se produzimos laranjas no Algarve, essas laranjas irão alimentar todos os portugueses. Se produzimos móveis em Paços de Ferreira obviamente o mercado é o todo nacional. Isto é, apesar de pensarmos localmente temos de ter sempre uma visão global do País. Mas agora gostaria apenas de me referir ao caso da gestão dos nossos recursos hídricos que são fundamentais, que são o ouro líquido deste século, e que, a não serem bem geridos, podem levar a um processo de desertificação do sul do País.

Nos últimos dias observámos a tremenda preocupação dos algarvios, dos agricultores ao setor do turismo, da indústria à sociedade em geral, porque já não há água nas barragens que estão praticamente vazias, prevendo-se que se esgote até ao final do ano. Então a solução é olhar geograficamente para cima e dizer que vão precisar da água da barragem de Alqueva. Quando os estudos da barragem se iniciou na década de 60, ainda no tempo da antiga senhora, era para servir o Alentejo. É uma barragem abastecida apenas pelo Rio Guadiana e os seus pequenos afluentes, mas também partilhada com os espanhóis que reivindicam não só a sua quota negociada, como não tem o mínimo de pudor de ir além dessa quota quando sentem a falta dela. Este ano foi paradigmático dessa situação, sem que o nosso Governo tivesse tido qualquer manifestação, mesmo que ligeira, contra o abuso da partilha da água, plasmada em acordos internacionais.

Alqueva foi pensada e construída com o objetivo de servir o Alentejo. A eficiência da utilização da água e das novas produções permitiu que se avançasse para uma segunda fase de mais 50 mil hectares, e garantir o abastecimento a mais populações, (como de Ourique), assim como apoiar a zona industrial de Sines. Mas este recurso hídrico é finito e ainda por cima tem como sócio de partilha, a Espanha, pouco fiável no cumprimento dos seus compromissos.

O potencial de Alqueva é imenso. Nesses poucos dias de chuva a barragem subiu quase 1 m estando ainda a 5 m da sua cota máxima. Desde que as comportas fecharam, já tivemos por 5 ou 6 vezes a cota máxima atingida, embora em situações pontuais. Mas não dará obviamente para também suprir as dificuldades que toda uma região do Algarve tem e terá cada vez mais, apesar da aposta em dessanilizadoras cuja rentabilidade e eficácia ainda terão tecnicamente muito para desenvolver para ser uma alternativa corrente e económica. Numa vertente de solidariedade, não é defensável o facto de dizermos que a água do Alqueva é só para nós, para o Baixo Alentejo e alguma parte do Alto Alentejo e Sines. A solidariedade nacional e a coesão territorial não se compatibiliza com protecionismos regionais, mas também não podemos olhar para os nossos compadres algarvios e dizer-lhes que vamos regar os seus laranjais de intensivos, os abacates que já totalizam milhares de hectares e que consomem água que é uma monstruosidade, vamos fornecer água para os 38 campos de golfe quando 1/3 apenas é regado com águas vindas das Etares, assim como não podemos dizer que vamos encher as milhares de piscinas privadas que têm, pois o Alqueva é grande mas a água não se multiplica por si só. Com isto não estou nem a minorar nem a não reconhecer a importância da atividade do turismo e da ocupação do território por estrangeiros que vão ajudando a nossa economia a desenvolver. Apenas estou a dizer, que, antes do mais o Algarve terá que fazer um plano diretor muito específico para a gestão da água para saber quais são os recursos que têm e quais são os recursos que são possíveis de ter. E na minha opinião, nós com Alqueva com certeza devemos também ajudar. Mas por si só, isto não é a solução. É um paliativo.

Mesmo num ano de seca em que pouco choveu e tem chovido no sul, porém tem chovido bastante no norte. Aliás o quadro da desertificação de Portugal não passa pelo norte, passa pelo sul, Alentejo e Algarve. Se no sul temos o Guadiana, no norte temos o Mira, Douro, Mondego, Tejo e muitos rios e riachos que tem muita água. E que mesmo neste momento em que nós temos o sul do país em seca quase extrema, temos essas barragens no limite máximo e a descarregar água para o mar e além do seu caudal ecológico. Estamos a desperdiçar no norte aquilo que faz falta no sul. Então é preciso trazer água do norte para o sul. Aliás o fenómeno não se passa só em Portugal passa-se em Espanha e passa-se noutros países inclusivamente em grandes países como a Rússia. O transporte de água do norte para o sul será uma necessidade num curto espaço de tempo, em muitas partes do planeta.

Até nem parece muito caro nem muito difícil de fazer, quer através do circuito de barragens já existentes, quer através dos rios e de afluentes que vão existindo desde o norte até ao sul, juntamente com algumas valas de ligação que obviamente terão que se abrir, fazer uma autoestrada de água, para a trazer do norte para o sul. É evidente que tudo isto não são rosas, haverão questões ambientais com alguma complexidade, como por exemplo juntar águas com ecossistemas e micro organismos diferentes, faunas e floras diferentes, e perceber como é que elas se podem compatibilizar. Estou convicto que a ciência é capaz de resolver, como resolveu com os flamingos da Ponte Vasco da Gama, as cegonhas de Castro Verde ou os morcegos de Alqueva. Mas no final, mais estudo menos estudo, mais intervenção menos intervenção, as dificuldades do transporte da água nessas ditas autoestradas, não se pode sobrepor a que se abandone metade do país à sua desertificação. Nada de estrutural e com grande impacto, se faz sem danos colaterais. É tudo uma questão de os minimizar e tomar opções.

Segundo alguns peritos, esta gigantesca obra estrutural de norte a sul, custaria um valor estimado de apenas 1.000 milhões. É claro que 1.000 milhões de euros é muito dinheiro mas se digo apenas, é porque comparo com 6.5000 milhões que vai custar o TGC Lisboa Porto para reduzir em 1,5 horas o tempo de transporte. Ou então os tais 4.000 milhões já enterrados na TAP ou os 650 milhões na Efacec. Não sei se são 1.000 milhões se são 1.500 milhões, mas que é um grande projeto estruturante e de coesão, tenho a certeza. Rentabilizando o que é desperdiçado a norte e trazê-lo para o sul com o impacto que isso tem no turismo, na agricultura, na coesão territorial. Porque onde há água, há vida e desenvolvimento, e onde não há, haverá deserto. E para combater, gastaremos muito mais em paliativos de duvidosa eficácia, pois serão mesmo isso, paliativos. Era importante este desígnio nacional, para que amanhã possamos todos ter um território coeso e com velocidade semelhantes, sem estarmos sujeitos a ter de rezar todos os dias a São Pedro, para nos mandar umas pinguinhas para o sul, quando no norte caem trovoadas….

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