Miguel Ramalho: Gestos de solidariedade em tempos de promoção da guerra e da xenofobia

Escrevemos esta crónica num dia marcado pela rendição em Azovstal dos militares ucranianos, dos neonazis do batalhão AZOV e, mais tarde saberemos, se também de alguns militares de países ocidentais… dê no que der a continuação deste episódio, o que parece consensual é que esta guerra está para durar. Quem está a ganhar, pelo menos por agora, nem russos nem ucranianos, a não ser que embarquemos alegremente no que as centrais de informação ocidentais desde o início, na ausência de contraditório, nos têm vendido.

Certo certo é que, segundo dados não contestados, o complexo industrial militar dos Estados Unidos da América ultrapassará pela primeira vez os 300 mil milhões de dólares, 60% do mercado mundial. Os lucros das empresas petrolíferas triplicam e o gás norte-americano conquista os mercados da União Europeia. Em suma, a invasão criminosa é Russa mas enquanto dura, e os estímulos para continuar por longo tempo são muitos, os lucros são dos Estados Unidos da América.

Por cá, dos episódios contra a Câmara de Setúbal tendo como pano de fundo a guerra contra o PCP, a propósito do atendimento feito por um casal russo nos serviços do Município, fica-nos o testemunho de uma imigrante ucraniana na Assembleia Municipal extraordinária realizada em Setúbal a 10 de maio: ‘estou aqui para exprimir a minha indignação, estão a denegrir a imagem de umas pessoas sem provas. Chamar de espião é muito grave e tendo em conta que este casal tem 2 filhos que estudam na escola, alguém pensou naquilo que estão a sofrer estes 2 meninos adolescentes, o bullying, alguém pensou nisso? Ou era necessário alguém vender uma notícia má que se vende melhor?’ Estas afirmações feitas com o sotaque de uma imigrante ucraniana com 20 anos de Portugal são muito mais convincentes do que ditas por qualquer de nós. São gestos como este, num mundo marcado por uma crise profunda de valores, que nos fazem continuar a acreditar na humanidade.

Miguel Ramalho

Coordenador da União de freguesias de Santiago Maior e S. João Batista