Opinião: Leonor D’argent

Cumprimento os ouvintes e colaboradores da Rádio Pax.

Hoje venho falar-vos da pandemia. Não desta pandemia da COVID-19, visível, sonora, que nos faz usar máscaras cirúrgicas e falar de vacinas. Falo-vos da outra pandemia, quase invisível, calada; a pandemia silenciosa que é a violência doméstica.

Segundo um estudo da Polícia Judiciária, entre 2014 e 2019 houve 128 homicídios em relações de intimidade. Em 111 destes, a vítima foi uma mulher.

A violência doméstica é um crime com milhares de vítimas em Portugal que envolve, na sua essência, uma assimetria de poder entre o agressor e a vítima, concretizada não só na violência física, mas também psicológica, económica ou sexual. É um flagelo que, apesar dos muitos esforços, tem sido particularmente difícil de eliminar da sociedade portuguesa. É um crime que não escolhe idades nem condições sociais estando, infelizmente, presente um pouco por todo o lado, sem que dele se fale. Além das vítimas agredidas, também as crianças que presenciam estas agressões são vítimas. A exposição de menores a violência doméstica afeta gravemente o seu desenvolvimento e, por isso a criminalização desta exposição tem sido defendida, por exemplo, pela Associação Portuguesa de Apoio à Vítima ou pelo Conselho Superior do Ministério Público, e no Parlamento por alguns partidos, nomeadamente pela Iniciativa Liberal. Infelizmente, esta criminalização é uma batalha ainda longe de estar ganha.

No passado dia 12, a morte do agente António Doce, em Évora, chocou o país. Morreu a dignificar a farda que não vestia nesse momento. Morreu salvando a vida a uma mulher que estava a ser agredida pelo seu companheiro. É um herói.

Também nós podemos ser heróis e salvar vidas, sem que, para isso, precisemos de dar a nossa vida. Basta-nos abrir os olhos e denunciar. A violência doméstica é crime público, pelo que denunciar é verdadeiramente um dever de todos nós. E sempre que há violência doméstica, é uma vida que está em causa. Mesmo que nos digam que é a última vez. Mesmo que nos digam que sempre foi assim. Por isso, o combate a esta pandemia silenciosa depende de todos.

Termino numa nota mais positiva, desejando as boas festas aos ouvintes e à equipa da Rádio Pax.